A cada quatro horas, Paraná vê uma morte por arma de fogo
É dia de Natal e uma família se prepara para as festividades tradicionais. Num cômodo da casa, uma mulher de 42 anos, encostada na porta de um quarto, conversa distraidamente com o filho e a nora. Enquanto isso o marido dela, de 46, pega uma espingarda, uma garrucha, na cozinha da residência e leva a […]
É dia de Natal e uma família se prepara para as festividades tradicionais. Num cômodo da casa, uma mulher de 42 anos, encostada na porta de um quarto, conversa distraidamente com o filho e a nora. Enquanto isso o marido dela, de 46, pega uma espingarda, uma garrucha, na cozinha da residência e leva a arma até o quarto, para guardá-la. No caminho, contudo, acontece um disparo acidental. A matriarca é atingida no rosto e morre na hora. A lista de mortos, contudo, por pouco não aumenta: sentindo-se culpado e desesperado pelo falecimento da esposa, com quem era casado há 25 anos e tinha um relacionamento tranquilo e amoroso, o homem ameaça se matar, mas é demovido da ideia.
O episódio acima, ocorrido em Centenário do Sul, no norte do Paraná, no final do ano passado, é uma entre as tantas tragédias registradas diariamente no Brasil. Ao longo de uma década, entre os anos de 2010 e 2019, foram 21.468 vidas ceifadas no estado em ocorrências envolvendo arma de fogo, o que dá uma média de seis óbitos por dia. No país, o número de mortes supera os 425 mil, com um registro a cada 12 minutos, aproximadamente.
Os dados acima foram tabulados pelo Bem Paraná por meio do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, sistema esse que é baseado nas declarações de óbito expedidas no país. Foram ainda consideradas as seguintes causas de óbito estabelecidas pela CID-10 (Classificação Internacional de Doenças) em seu Capítulo XX: W32 a W34 (acidente/disparo acidental de arma de fogo); X72 a X74 (lesões autoprovocadas intencionalmente/suicídio por arma de fogo); X93 a X95 (homicídios/agressões intencionais por arma de fogo) e Y22 a Y24 (intenção indeterminada, ou seja, não foi possível determinar se a morte foi um homicídio, suicídio ou mesmo um acidente).
Considerando-se, então, a causa do óbito e os dados acumulados na década, temos que, no Paraná, a principal causa de morte por arma de fogo são os homicídios (93,84%), seguido pelos casos de suicídio (3,41%), causa indeterminada (2,32%) e acidentes (0,42%). A nível nacional, os porcentuais são um pouco diferentes, bem como a disposição das causas. Em primeiro temos os homicídios (94,42%), em segundo as ocorrências cuja intenção do agente era indeterminada (2,59%) e na sequência os casos de suicídio (2,26%) e acidentes (0,73%).
Em número absoluto, as unidades da federação com mais mortes por arma de fogo no período analisado foram Bahia (51.676), Rio de Janeiro (37.875), São Paulo (34.616), Ceará (32.289) e Minas Gerais (30.932). O Paraná, por sua vez, aparece na nona colocação, atrás ainda de Pernambuco (29.884), Pará (27.031) e Rio Grande do Sul (21.743).
Por fim, se pegarmos a média de óbitos provocados por arma de fogo nos últimos 10 anos e também a média populacional de cada estado e o Distrito Federal, verificamos que as maiores taxas de morte por 100 mil habitantes pertencen a Alagoas (47,75), Sergipe (38,76), Rio Grande do Norte (38,05), Ceará (36,56) e Bahia (34,92), todos esses estados localizados na região Nordeste. O Paraná aparece na 20ª posição entre as 27 unidades da federação, com uma taxa de 19,49. É mais que o dobro, porém, das taxas de Santa Catarina (8,44) e São Paulo (7,90).
Levantamento aponta a interiorização dos casos no Estado
Entre os municípios paranaenses, Curitiba concentra o maior número de mortes por arma de fogo na década, com 10.242 registros (o equivalente a 21,8% do total). Foz do Iguaçu, no oeste do Paraná, e Londrina, no norte do estado, aparecem na sequência, com 3.677 e 2.263 registros, respectivamente.
Um fenômeno curioso que tem se verificado com o passar dos anos, contudo, é a interiorização da violência armada no Paraná. Em 2010, por exemplo, a regional metropolitana, que engloba Curitiba e os municípios do entorno, concentrava 53,31% das mortes por arma de fogo no estado. Em 2019, esse porcentual foi para 33,93%. Por outro lado, praticamente todas as outras 22 regionais de saúde viram sua participação no total de óbitos do Estado crescer, com especial destaque às regionais de Paranaguá (que passou de 2,32% para 4,87%), Ponta Grossa (de 1,91% para 4,19%), Guarapuava (de 1,83% para 4,94%), Francisco Beltrão (de 0,90% para 2,47%) e Telêmaco Borba (1,23% para 3,30%).
Dados preliminares de 2019 apontam queda significativa
Por outro lado, a boa notícia é que no último ano com dados disponíveis (2019, com dados ainda preliminares) o indicativo é de uma queda significativa no número de óbitos por arma de fogo no Brasil e no Paraná.
No Estado, o número de mortes por arma de fogo foi de 1.354 no último ano, 19,3% a menos do que em 2018 e o menor registro para o Paraná desde o ano 2000, quando foram 1.312 mortes desse tipo.
No país, o total de mortes provocadas por arma de fogo no último ano foi de 33.822, número 22,7% inferior ao verificado em 2018 e também o menor registro desde 1999, ano em que o Brasil teve 31.198 mortes causadas por arma de fogo. Das 27 unidades da federação, apenas duas (Amazonas e Amapá, ambas no Norte) viram aumentar o número de mortes por arma de fogo no último ano.
Fonte: Bem Paraná